Podemos falar sobre outra coisa?

 




Sim.

Sobre as crianças aprendendo a se aproximar de colegas
nas aulas à distância?

Sobre os amores jovens que se espreitam como felinos aprisionados
nas janelas do isolamento?

Ou sobre o rapaz da moto, com o estudo inacabado,
que entrega a comida pronta?

Ou a faxineira que levou a limpeza da casa do patrão
para dentro do ônibus lotado.

Talvez a funcionária terceirizada na empresa farmacêutica
que não pode faltar por uma simples gripezinha.

Ou sobre o desempregado pedinte ao portão que usa a máscara
para esconder sua vergonha?



Sim, podemos falar sobre outra coisa.

Sobre os poemas que poderiam ser feitos com as palavras perdidas
à espera da vacinação?

Sobre a escolha do absurdo máximo para ocultar a lógica insustentável do inimigo mínimo?

Ou sobre a aglomeração de culpados em conexões complexas
praticando o assassinato dos inocentes?

Ou as mentiras transmitidas de forma virulenta que acabam com reputações e vagas nos hospitais.

Talvez possamos falar sobre a falta de epitáfios
para atender a demanda por novas lápides.

Ou sobre os dias irrecuperáveis
sem o beijo das avós?


Outros assuntos é que não nos faltam.






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