Porque apaguei a charge de ontem


Amedrontado pelo atentado a bomba cometido por um bolsonarista em Brasília, - sendo o medo e a bomba dois resquícios da ditadura militar - criei e postei neste blog uma charge criticando o terrorista e não suas ideias. 

Por mais que eu condene a ideologia que conduziu essa pessoa transtornada ao seu ato extremo, tentei compreender as possíveis causas para seu gesto insano.

Qual o grau de sanidade mental que ele possuía?

Quantas fake news foram suficientes para ativar sua paranoia alimentada na baixa instrução e na pobreza econômica, social e cultural?

Qual algoritmo das redes sociais capturou sua atenção obsessiva transportando-o para dentro de uma das bolhas dos radicais como ele, estacionados na frente dos quartéis e invadindo a Praça dos Poderes em janeiro de 2023?

Quantos discursos populistas ele precisou ouvir para minar totalmente sua confiança na justiça e na democracia?

Quanto ódio foi instilado nele por falsos salvadores da pátria para que seu autocontrole tenha sido estraçalhado, como foi seu corpo pelos artefatos explodidos?

Então, senti-me mal em publicar aquela charge agressiva contra uma pessoa, - possivelmente - também uma vítima da sociedade em que vivemos.

Uma sociedade que continua dividida, e cada vez mais, em “nós e eles”, abrindo caminho para a violência e a morte das democracias.

Não quero mais participar desta polarização.

Apesar de todas as injustiças deste mundo, não concordo com nenhuma forma de violência política, por mais que pareça justa, pois a maioria das tomadas do poder por meios violentos não foi capaz de sustentar democracias em seguida.

Curiosamente, quanto mais aumenta minha convicção sobre a necessidade da superação do capitalismo por uma sociedade socialista, mais cresce minha certeza de que isto só poderá ocorrer por caminhos democráticos, ou não ocorrerá.

Então, preciso reconhecer a legitimidade de quem pensa diferentemente de mim, que é a base da democracia.

Para isso, não posso mais desqualificar meus adversários em bases morais. Thiago de Mello escreveu num poema, sobre a esquerda: “nós não somos melhores, melhor é a nossa causa”.

Melhor é a democracia, querido Thiago de Mello.

Então, como homem, branco, hétero, classe média, educação de nível superior, ateu e socialista, tentarei não mais me julgar melhor do que outra pessoa diferente de mim em quaisquer destas características.

Apaguei a charge.

E comecei a me sentir com menos medo - ou mais coragem – para defender algumas ideias para um mundo, este sim, melhor.

 

LOR

PS: isto não significa que quem ameaça a democracia deva ser “compreendido” ou “anistiado”. Pelo contrário, seu julgamento justo e eventual condenação e prisão são justamente para proteger a sociedade democrática.


Comentários

  1. Super LOR : seu comentário sobre a artlharia de estratégias que corrompem e deixam vulnerável um indivíduo a perder todos os filtros sobre distorções, fake news já cabe nos brindar com uma charge didática !

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