Nós e os Sistemas
Muitas pessoas da minha geração, na juventude, queríamos “derrubar
o sistema”.
Hoje, precisamos defender algumas instituições que criticávamos naquela época: a Democracia
(mesmo que apenas a liberal), a Justiça (ainda que tardia) e o Congresso (apesar
de, há décadas, dominado pelo Centrão).
Há até ministros “de esquerda” obrigados a defender o
capitalismo adotando a chamada austeridade fiscal, imposta pelo liberalismo, pelos
bancos mundiais e fundos monetários internacionais, idealizada justamente para
quebrar os trabalhadores e seus sindicatos que ameaçavam derrubar o sistema
capitalista com revoluções socialistas no início do século passado.
Hoje, acabamos virando pessoas defensoras daquele sistema injusto
que combatíamos porque, do outro lado, a direita está destruindo rapidamente
as instituições que, mesmo imperfeitas, sustentam a civilização atual e que, se
houvesse vontade política, poderiam nos salvar da catástrofe climática, como as
democracias, a imprensa, as universidades, a ciência, a Justiça Internacional, a ONU, os Tratados de Não-Proliferação de Armas Nucleares, os Acordos
Climáticos, etc.
Trumps, Bolsonaros, Narendas, Putins, Órbans, Milleis e outros chegam
ao poder com o objetivo explícito de desmontar aquelas instituições e conseguem
ganhar eleições corrompidas por bilionários e por intensa manipulação
ideológica por meio da inteligência artificial e redes sociais. Uma vez no
poder, fazem de tudo para fortalecer os inimagináveis privilégios da elite
atual formada por monarcas tecnológicos (ver Nexus, último livro do Yuval Noah Harari).
Hoje, sem controle, cada vez mais poderosos do que qualquer
nação ou Estado, os gigantes capitalistas seguem impunes para explorar ao máximo
a humanidade e o planeta.
O “sistema” agora são eles.
E essa nova fase do capitalismo nem precisa dos tanques nas ruas,
como a gente vê no filme “Ainda estou
aqui”, uma obra de arte impecável sobre o brutal assassinato do ex-deputado
Rubens Paiva sob
tortura, e a longuíssima luta de Eunice Paiva para sobreviver e cuidar de sua família, durante a ditadura civil-militar brasileira que interrompeu as
reformas populares.
O filme lembra como éramos pessoas movidas pela solidariedade,
corajosas e ingênuas! Arriscávamos nossas vidas por justiça social,
enfrentávamos o perigo e continuávamos acreditando que iríamos derrubar a
ditadura, mesmo de cabeça para baixo num pau de arara.
Hoje, somos sobreviventes do naufrágio daquelas certezas,
mas flutuamos nas águas turvas das tragédias contemporâneas - recentes e
próximas, - sobre tábuas de esperança – de transformar o “novo sistema” – e,
assim, estamos aqui.
Ainda.
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