A direita unida jamais SERIA vencida?

 



Para amigues Facundes

Dizem que nós, da esquerda, somos incapazes de nos unir, apesar de abraçarmos uma ideologia coletivista, mas a união me parece intrinsicamente tão ou mais difícil num grupo de pessoas com uma ideologia individualista, mesmo que tenham um objetivo final em comum, que é a exploração da maioria.

Se a direita fosse unida, não haveria a Segunda Guerra Mundial entre governos de vários tons de direita, democratas e republicanos compartilhariam melhor seus privilégios econômicos e ainda estaríamos sob a ordem unida da ditadura militar brasileira. 

Se a direita fosse um bloco único, contando com a máquina do estado e as forças armadas, ainda estaríamos convivendo com reis e imperadores, tipo os Pedros de Orleans e Bragança e a escravidão.

Achar que somos desunidos e que a direita é unida em torno do lucro e dos seus privilégios pode resultar de uma certa miopia social, que nos leva a achar que orientais, indígenas ou negros são “todos iguais”. Curiosamente, esta ideia parece exatamente o reverso do pensamento de Olavo de Carvalho, que disse que a esquerda usa a tática da tesoura, ou seja, finge ou parece dividida em duas lâminas, mas teria apenas um objetivo, controlar o mundo e implantar o comunismo.

Quando digo pessoas de direita, refiro-me àquelas que defendem a manutenção dos privilégios por herança, raça ou saque, como as monarquias, as supremacias raciais, os colonizadores e, mais atualmente, a liberdade dos ricos para explorar outros seres humanos, incluindo, no limite, a escravidão.

Na outra ponta, penso que a esquerda seria formada por aquelas que se opõem aos privilégios de qualquer origem, desde as pessoas democratas, que se contentam com a igualdade eleitoral, até as socialistas, para quem é fundamental também a democracia econômica.

Entre as duas extremidades, há um amplo espectro humano, no qual cada pessoa pode se encontrar numa determinada posição, por razões históricas, biológicas, sociais e culturais. De passagem, acho que esta posição política individual não se trata de uma escolha voluntária, mas do resultado do contexto no qual calhamos de nascer e viver.

Se não compreendermos a complexidade do espectro político, podemos cair no maniqueísmo simplista de achar que existe apenas UMA direita, ou deveria haver apenas UMA esquerda. Nesta armadilha cognitiva, não percebemos as contradições que ocorrem em qualquer grupo humano, por exemplo, entre capitalistas nacionalistas e capitalistas estrangeiros, entre países governados por direitistas que se envolvem em conflitos, inclusive armados, entre plataformas de direita que atendem a alguns, mas não a outros, entre direitistas que acreditam na ciência e os terraplanistas, entre capitalistas ateus e religiosos, entre burgueses extremamente machistas e outros menos, e por aí vamos.

Não se trata apenas de “conhecer o inimigo, para melhor combatê-lo”, pois no espectro amplo entre direita e esquerda cada pessoa traz em si também contradições, uma vez que posso me situar mais à esquerda numa questão e mais à direita em outra. Indo além, acho que preciso compreender melhor a amplitude das posições políticas da humanidade para atender ao meu desejo inevitável de atuar sobre o mundo, transformando-o num planeta sem privilégios. Sim, Olavo tinha razão: quero o espectro do socialismo implantado no mundo inteiro.

Quanto ao poder da direita, lembro que nos últimos dois séculos, desde o surgimento das revoluções americana e francesa, a direita vem perdendo poder político com o crescimento da democracia em muitos países - segundo Steven Pinker, apesar da desigualdade econômica continuar aumentando 
- segundo Thomas Piketti. Foi justamente contra o controle estatal dos privilégios capitalistas, que vinha sendo imposto pelos democratas e socialistas, vitoriosos no pós-Segunda Guerra, que a direita se reorganizou temporariamente no neoliberalismo pandêmico de Reagan e Thatcher na década de oitenta.

Estava indo tudo razoavelmente bem para a direita, quando a crise econômica de 2008 abalou a retomada dos privilégios, permitindo que as facções mais à direita do espectro, como os fascistas, recuperassem sua força parcialmente perdida para a direita social-democrata, que vinha controlando o mundo ocidental nas quatro décadas anteriores.

E agora, depois de alguns estragos causados pelos bolsonaristas aos próprios interesses dos capitalistas, uma parte do espectro da direita brasileira se organiza para retomar o governo, apostando no acordo entre Lula e Alckmin.

Torço para o poder se deslocar o máximo possível para o lado esquerda do espectro, onde menos gente morre de COVID, fome, feminicídio e racismo.



LOR

Fevereiro 22


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