72 horas de governo!

Criei a charge acima a partir do texto abaixo:

  

O esgotamento do fiscalismo à brasileira

Monica de Bolle

(Carioca de 48 anos, PHD em Economia, vive em Washington, Leciona na John Hopkins University)


Hoje é dia 4 de janeiro. Estamos no 3° dia do novo governo. No 3° dia já há gente dizendo q tudo está sendo feito de forma errada na economia "apesar da herança de Bolsonaro". Para quem tem o privilégio e, muitas vezes, o desprazer, de observar o Brasil de "longe", os alardes soam absurdos.

Como é possível estar tudo errado na economia no 3° dia de um governo? Como é possível fazer tais afirmações taxativas sem q existam outras intenções? Existem outras intenções.
Há alertas e críticas q são feitos para o bem do País, mas ñ esses. Esses pretendem apenas continuar a ocultar aquilo q se torna cada vez + visível para a população: o fiscalismo é tão somente defesa de interesses por intermédio do uso de falácias econômicas.


As falácias ainda são facilmente engolidas por parte da mídia, mas ñ + por quem sentiu o resultado do fiscalismo diretamente: a avenida aberta para a ascensão de Bolsonaro.

Reza o fiscalismo q programas sociais são inflacionários.
Direcionar tantos recursos aos + pobres causará danos profundos a essas mesmas pessoas pela via inflacionária. Examinemos esse argumento, e quem são as pessoas q o defendem.


Comecemos com a Selic, a taxa de juros de referência determinada pelo Banco Central, de 13,75% ao ano. Lembremos q a inflação estimada para 2022 é de cerca de 5,8%. A taxa de juros real é a diferença entre os juros nominais (a Selic, por exemplo) e a inflação. Logo, os juros reais brasileiros estão em inacreditáveis 8%, ou perto disso. Não há país no mundo q chegue perto de tamanho desequilíbrio.

Quem são as pessoas q soam alarmes inflacionários qdo se fala em despesas com programas sociais? Por óbvio ñ são aquelas por eles beneficiados, mas aquelas q não querem ouvir falar de reformas tributárias progressivas, ainda q falem em “necessidade de reforma tributária”.

Os fiscalistas há anos dizem q a carga tributária brasileira já é demasiado elevada. Ora, elevada para quem? Não para eles, cuja renda é majoritariamente composta de lucros e dividendos -- renda q, no Brasil, ñ é tributada. Os fiscalistas, em sua maioria, são subtributados.

Mas ñ é "só isso". Os fiscalistas no Brasil, muitos donos ou sócios ou associados a fundos de investimento, tbm pagam poucos impostos como proporção da renda, visto q os tributos no Brasil recaem, sobretudo, no consumo.


Quem paga + tributos sobre o consumo? Como proporção da renda, são os + pobres, ñ os + ricos. Programas sociais para os + pobres, vejam só, até se autofinanciam em parte: como a carga tributária incide sobre o consumo e os + pobres consomem mais, essas pessoas ajudam a elevar a receita do governo q paga, em parte, pelos programas q recebem.

Não para aí a hipocrisia. Quem recebe o grotesco diferencial de juros da dívida com a Selic nas alturas? Os detentores de títulos públicos. E quem são eles? Ah, adivinhem...são os mesmos q só falam de despesa primária e sequer tocam na despesa financeira do governo. Por quê? Porque a despesa financeira do governo, os pagamentos de juros exorbitantes para lá de incompatíveis com a inflação estimada e esperada, representam uma parte da renda q credores/fiscalistas recebem. Está dado o conflito distributivo e a historinha fiscalista.


Para ocultar os ganhos q recebem e q, simultaneamente, paralisam a economia -- quem em sã consciência vai investir qdo as taxas de juros reais estão em 8%? -- vendem as falácias econômicas nos jornais e em parte da imprensa. Qto + alarde, melhor.

Ocorre q a discussão da PEC de Transição, entre outros debates recentes, expôs aquilo q se oferece como "responsabilidade fiscal". Tentaram de toda forma -- por meio de cartas, entrevistas, colunas -- impedir q os programas sociais fossem devidamente financiados.


Mas eis q os programas sociais estão enquadrados na Constituição Federal como Direitos Fundamentais. Rebaixá-los equivale a rebaixar a força normativa da Constituição. Durante 6 anos, foi exatamente isso q o Teto de Gastos defendido por fiscalistas fez. Qdo se rebaixa a Constituição, abrem-se as portas para o desfile dos anti-democratas. A ultradireita anti-democrática é fruto do fiscalismo excessivo q enfraqueceu a Constituição, queiram os fiscalistas aceitar o resultado de sua tecnocracia cega ou não. Nada nesse mundo escapa às forças da política, nem mesmo o puritanismo tecnocrático.

Com a derrocada do Teto, temos a chance de ñ + permitir o rebaixamento da Constituição. Temos a chance de enquadrar a discussão econômica dentro dos marcos constitucionais, e ñ tratá-la como algo q transcende a Lei das Leis.
Temos a chance de olhar a hipocrisia nos olhos e de dizer "Chega". O fiscalismo hipócrita está em vias de esgotamento.


 

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