O julgamento dos ratos
À medida que os juízes pronunciavam seus votos, foram se confirmando as expectativas gerais de que, apesar de haver provas evidentes de que a peste vinha sendo disseminada pelos acusados, os magistrados iriam inocentar os criminosos porque eram seus amigos e a culpa era das pulgas.
Ainda assim, eu cultivava alguma esperança de que justificativas dos juízes para inocentarem os réus fossem inteligentes o bastante para causarem em mim alguma dúvida, leigo que sou no juridiquês. Ao contrário, fui ficando cada vez mais envergonhado diante da argumentação grosseira, incoerente e descaradamente falsa daqueles que recusaram as provas do crime diante de todos, por causa de possíveis e escusos interesses pessoais. A montanha de documentos reunidos pelo relator pariu, sim, ratos.
Desci mais um nível no meu desencanto democrático e compreendi de novo o desespero do recurso às armas, ao qual foram levados muitos na juventude da minha geração, diante da impossibilidade eleitoral de mudança da estrutura social injusta e cruel. Estou tentando me pacificar com o aprendizado da paciência que veio com o tempo, repetindo-me o mantra de que mudar as coisas não é simples, nada é fácil.
Ainda que eu saiba que a democracia é uma instrumentalização do estado capitalista para viabilizar os interesses econômicos da classe dominante, passada minha explosão juvenil armada, acalentei a utopia de que juntos e pacificamente somos melhores e mais sábios e assim poderíamos nos salvar da injustiça social, da guerra nuclear e do aquecimento global. Bastaria nos organizarmos casa a casa, bairro a bairro, trabalhador a trabalhador para construirmos uma sociedade civil capaz de retomar o controle das instituições democráticas fazendo-as promover o bem-estar geral.
Há quase meio século reavivo as brasas deste sonho pela manhã e apesar do passo em direção à luz, na Constituição de 1988, os acontecimentos dos últimos trinta anos mostraram-me que o belo horizonte está mais distante do que eu pensava. As grandes corporações se tornaram mais poderosas e incontroláveis, a concentração de renda aumentou a com ela a injustiça social, a informatização da vida fragmentou a solidariedade humana e algumas promessas de reformas socialistas resultaram em populismo, fisiologismo e corrupção em todo o mundo.
Agora, tremo de medo diante da versão mais explícita e arrogante do imperialismo americano que assumiu aos trampos e barrancos os controles das ogivas nucleares e do clima, pois sinto que nos aproximamos mais um pouco da Sétima Extinção, a nossa. Se algo há que possamos fazer contra isso, talvez nosso tempo seja curto. O meu pelo menos, o é.
Nessa maré de baixa autoestima, pensei que todo esse pessimismo não passava de resmungos de um velho latino americano e apocalíptico, mas então li os pensamentos de outro velho, o norte americano Noam Chomsky, em seu último livro “Quem manda no mundo? ” (2017) e minha solidão se sentiu acompanhada pela sua esperança, ainda que tardia.
Os ratos não concordariam com as inúmeras provas, documentos e argumentos apresentados por Chomsky, que mostram a progressiva deterioração da democracia em todo o mundo e as agressões imperialistas e crimes de guerra (especialmente dos Estados Unidos e de Israel). O livro é uma defesa contundente da desmilitarização, a favor do controle das emissões poluentes e uma denúncia cristalina sobre como o neoliberalismo aumentou a destruição do planeta.
Os ratos não gostariam deste livro, mas para eles o futuro não importa mesmo.
Ainda assim, eu cultivava alguma esperança de que justificativas dos juízes para inocentarem os réus fossem inteligentes o bastante para causarem em mim alguma dúvida, leigo que sou no juridiquês. Ao contrário, fui ficando cada vez mais envergonhado diante da argumentação grosseira, incoerente e descaradamente falsa daqueles que recusaram as provas do crime diante de todos, por causa de possíveis e escusos interesses pessoais. A montanha de documentos reunidos pelo relator pariu, sim, ratos.
Desci mais um nível no meu desencanto democrático e compreendi de novo o desespero do recurso às armas, ao qual foram levados muitos na juventude da minha geração, diante da impossibilidade eleitoral de mudança da estrutura social injusta e cruel. Estou tentando me pacificar com o aprendizado da paciência que veio com o tempo, repetindo-me o mantra de que mudar as coisas não é simples, nada é fácil.
Ainda que eu saiba que a democracia é uma instrumentalização do estado capitalista para viabilizar os interesses econômicos da classe dominante, passada minha explosão juvenil armada, acalentei a utopia de que juntos e pacificamente somos melhores e mais sábios e assim poderíamos nos salvar da injustiça social, da guerra nuclear e do aquecimento global. Bastaria nos organizarmos casa a casa, bairro a bairro, trabalhador a trabalhador para construirmos uma sociedade civil capaz de retomar o controle das instituições democráticas fazendo-as promover o bem-estar geral.
Há quase meio século reavivo as brasas deste sonho pela manhã e apesar do passo em direção à luz, na Constituição de 1988, os acontecimentos dos últimos trinta anos mostraram-me que o belo horizonte está mais distante do que eu pensava. As grandes corporações se tornaram mais poderosas e incontroláveis, a concentração de renda aumentou a com ela a injustiça social, a informatização da vida fragmentou a solidariedade humana e algumas promessas de reformas socialistas resultaram em populismo, fisiologismo e corrupção em todo o mundo.
Agora, tremo de medo diante da versão mais explícita e arrogante do imperialismo americano que assumiu aos trampos e barrancos os controles das ogivas nucleares e do clima, pois sinto que nos aproximamos mais um pouco da Sétima Extinção, a nossa. Se algo há que possamos fazer contra isso, talvez nosso tempo seja curto. O meu pelo menos, o é.
Nessa maré de baixa autoestima, pensei que todo esse pessimismo não passava de resmungos de um velho latino americano e apocalíptico, mas então li os pensamentos de outro velho, o norte americano Noam Chomsky, em seu último livro “Quem manda no mundo? ” (2017) e minha solidão se sentiu acompanhada pela sua esperança, ainda que tardia.
Os ratos não concordariam com as inúmeras provas, documentos e argumentos apresentados por Chomsky, que mostram a progressiva deterioração da democracia em todo o mundo e as agressões imperialistas e crimes de guerra (especialmente dos Estados Unidos e de Israel). O livro é uma defesa contundente da desmilitarização, a favor do controle das emissões poluentes e uma denúncia cristalina sobre como o neoliberalismo aumentou a destruição do planeta.
Os ratos não gostariam deste livro, mas para eles o futuro não importa mesmo.
Triste, e o tempo vai se esgotando.
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