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Mostrando postagens de dezembro, 2024

Não espere muito do fim do mundo

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Achei espirituoso e relaxante esse título do filme romeno exibido na Europa em 2024 ( ver aqui ). Não vi o filme ainda, mas o título em si me fez pensar sobre o que ando esperando para o próximo ano, o que, por sua vez, sugere que minha intuição é de que o tal fim estaria próximo. Claro, estou pensando na ascensão dos Trump, crise climática e ameaça nuclear, que, combinados, ofuscam e se interligam a outros problemas, como novas pandemias, desigualdades econômicas, redes sociais e controle político global por meio da inteligência artificial. O interessante no título do filme é que me fez pensar que - talvez - o fim do mundo - ou da civilização que habitamos - já esteja acontecendo aos poucos e a gente vai se acostumando como o sapo na panela em aquecimento. Portanto, não haveria um determinado momento X (com ou sem trocadilho) em que diríamos: Acabou, pessoal! Todo mundo joga fora os celulares e quem puder que encontre uma caverna! Se esta hipótese for verdadeira, e aí estaria ...

À espera de nada

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  Nos infinitos dias até ontem,  um poderoso futuro trazia-me vigor e coragem  para a guerra santa que desde jovem me arrebatara. Bastou-me um ferimento banal,  mas incurável - no tempo de vida que me resta,  para tornar-me incapaz de continuar nas trincheiras onde não conhecia o vazio e nem o tédio. Jogado numa enfermaria,  entre feridos e moribundos,  espero a padiola que me levará para longe das batalhas pela vida, para deixar-me nos campos melancólicos e irreversíveis da velhice e do esquecimento. À espera da morte, descubro a ilusão:  o suposto inimigo durante anos  nada passa de partículas subatômicas,  indiferentes ao que chamamos de destino,  sentido ou razão. Senador Ferrante Anno Domini X

Manifesto filosófico de Galileu

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  Alerta! Estamos num universo formado por energia em expansão aleatória, não sabemos sua origem antes do Big Bang e nem o que há para além dos seus limites, que são inatingíveis pela ciência contemporânea. A formação dos primeiros átomos se deu ao acaso, por condensação gravitacional da energia, gerando em seguida estrelas e galáxias. Portanto, o acaso é um dos princípios fundamentais do universo, da origem da vida em nosso planeta e da sua evolução. A espécie humana surgiu numa longa sequência de casualidades, entre elas as características neurais que permitem a linguagem, e com isso se tornou capaz de representar a vida no presente, no passado e no futuro, ou seja, construir narrativas, histórias. As diversas civilizações humanas negam o acaso e atribuem sua história a decisões divinas ou voluntárias, tomadas a partir de valores religiosos e morais. Elas precisam negar o acaso porque ele contraria o senso comum de que possuímos livre arbítrio, ou seja, o acaso atrapa...

Trumpetas do Apocalipse

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Quantas vezes o tempo mudou, enquanto limpei os pratos da festa de ontem: de sol radiante para nuvens indecisas, algumas, franca chuva, outras, breves respingos que seguiram adiante para incertas geografias.   Ainda assim, tolo aprendiz de cartomante, tento me preparar para o próximo tempo que pode se repetir sobre nós: outra tempestade mundial, provocada por homens ressentidos, pobres de direita , - como há um século, uns germânicos - que elegeram - voluntariamente! - seu maior ditador.   Haverá outras louças de festas para lavar?  

Um outro mundo é possível?

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Em busca do senso perdido

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  Para Flora Augusta   Tenho sido um leitor voraz na esperança de que, em algum momento, alguém venha revelar o sentido da vida para mim. Os anos se passaram e cheguei à “A Velhice” de Simone de Beauvoir, um ensaio profundo que ela escreveu aos 62 anos em busca da compreensão dos significados social, psicológico, político, econômico e filosófico da fase da vida quando nos tornamos velhos. Apesar de eu estar atrasado em mais de meio século, - embora, talvez, na idade suficiente para o ler - tenho descoberto no texto de Simone que a maioria dos escritores e artistas – em cujas obras busquei respostas para minha angústia existencial – lutava ansiosamente com a mesma perplexidade diante do próprio envelhecimento, o qual, de formas variadas, lhes revelou a falta de sentido nos modos de vida que construímos nas diversas sociedades humanas. Ao que parece, segundo Simone, passamos a maior parte de nossas vidas obrigados a nos ocupar com outras coisas e não nos sobra tempo para...

Lembrando do último natal com vovó Maria

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O suicídio do Coringa

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  No livro “ O pobre de direita ”, Jessé Souza encontra semelhanças entre muitos dos eleitores de Bolsonaro e o personagem Coringa, interpretado por Joaquin Phoenix no filme lançado em 2019 . Na análise de Jessé, fundamental para quem quer compreender o mundo atual, os bolsonaristas ( ou trumpistas  e outros pobres que votam com a extrema direita), têm em comum com o Coringa o sentimento de humilhação constante. No caso do personagem, pelas suas dificuldades neurológicas, no caso dos eleitores a ameaça crescente aos seus privilégios masculinos, especialmente homens brancos e pobres, descendentes de alemães e italianos no Sul e Sudeste, redutos eleitorais da direita no Brasil. Jessé também nos ajuda a entender porque negros, especialmente evangélicos, votam em Bolsonaro e vale a pena conhecer seus argumentos sólidos.   Quanto aos homens, brancos e pobres, a perda de seu poder simbólico vem acompanhada de frustração econômica, porque na sociedade capitalista, ...

Constelações na lama

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Para Titina    Encaixo a folha seca nos ferros da minha bicicleta, a branca, do Natal de 1959, quando meu avô se dizia juscelinista e meu pai lacerdista, e pedalo zunindo como uma cigarra para o Parque Novo.   Atravesso a ponte sobre o ribeirão Mumbuca, que desce mansinho das matas ciliares, inocente de lixos, plásticos, nylons, enchentes e tragédias.   As marcas dos pneus na terra úmida formam arcos, espirais e elipses zodiacais, constelando o chão em galáxias verossímeis num universo que sinto infinito e em expansão.   Pedais, músculos e cérebro me obedecem sem dor, e confio nas manobras que faço com meu corpo, derrapando nas bordas de um buraco negro, que ameaça me devorar nas entranhas de um colégio interno.   As sombras multifolhas das árvores ao redor, sem as pragas daninhas dos aquecimentos globais, acrescentam nebulosas ao berçário de estrelas que o barro esmagado transforma em nuvens de fumaça e carbono...