As ditaduras não gostam de más notícias
Teria sido possível evitar a pandemia de coronavirus se a conduta do governo da China tivesse sido diferente? O que podemos aprender com o que está acontecendo?
Recebi um vídeo que está disponível na internet (ver aqui https://www.youtube.com/watch?v=_V4r5ibOm5g ), produzido pelo grupo brasileiro da SPOTNIKS, que construiu uma linha do tempo desde o momento em que surgiu a primeira pessoa com suspeita de uma infecção causada por um novo vírus na China até o dia 31 de março de 2020.
Com uma hora de duração, o documentário apresenta diversos fatos que demonstram a brutal repressão policial e censura científica por parte do governo chinês sobre o assunto coronavírus, com prisões de profissionais da saúde e cientistas e desaparecimento de pessoas, bloqueio de informações e ações políticas internacionais que provavelmente contaram com a conivência da Organização Mundial da Saúde.
No vídeo fica evidente que a ditadura chinesa tentou ocultar da própria população e do mundo que havia um risco de epidemia em Wuhan, o que atrasou as medidas de proteção das pessoas, permitindo que o surto se propagasse na China e depois para outros países e se tornasse a pandemia que estamos vivendo. Os governantes chineses cometeram um crime típico da estupidez dos ditadores, um crime contra a humanidade, e isso só foi possível por causa do controle tirano que o governo chinês exerce sobre cada um dos milhões de habitantes da China.
O partido comunista da China tem um projeto de hegemonia mundial conduzido por Xi Jinping (ver aqui excelente documentário português sobre a versão chinesa trumpiana do Make China Great Again: https://youtu.be/m9Uz-9wQsBE ), que pode sair fortalecido depois da recessão mundial causada pelo coronavirus. Não estou embarcando na teoria conspiratória de que a China inventou o coronavirus para controlar o mundo: o projeto de expansão já existia muito antes. Para esse projeto é preciso silenciar os opositores, as más notícias e a ciência, o que somente se consegue com uma ditadura.
Toda e qualquer ditadura é desumana e cruel. Tanto faz se ela se implanta com o objetivo explícito de dominação por um determinado grupo social ou se ela se apresenta como um meio para a sociedade alcançar um objetivo humanitário no longo prazo. Para mim, nenhum fim justifica a perda da liberdade política, porque é a liberdade de expressão que permite a correção de rumos e evita a transformação dos governantes em tiranias vitalícias (como Xi Jinping já se tornou).
Conhecemos diversas tentativas bem intencionadas de redução das desigualdades econômicas que impuseram o sacrifício da liberdade política, as quais mostraram que a forma como se chega ao poder é a forma como se continua no poder. Se o conquistamos pelas armas, governaremos para sempre com elas sobre a mesa. Se chegamos pela mentira, fake News e fraudes, continuaremos precisando delas para governar.
Sim, me dizem, há países vivendo sob variados graus de liberdade política, mas com imensas desigualdades econômicas (como o nosso) e isto não seria uma verdadeira democracia. Sim, concordo que a plena democracia tem que ser política e econômica, mas para isto é preciso que cada pessoa tenha escolhido livremente os caminhos para chegar a esta sociedade ideal. Sem tutores, sem líderes populistas, sem ditadores. Utopia? Sim, quem não as tem para evitar as distopias?
Então, não posso aceitar os crimes da ditadura chinesa nem de qualquer outra ditadura, inclusive daquela que nos atingiu violentamente por vinte anos e ainda defendida por pessoas que querem voltar o Brasil ao Braziu dos anos 50 (ver aqui Os 100 anos de Bolsonaro num post anterior https://lorcartunista.blogspot.com/2020/02/meu-medo-do-abismo.html ).
O documentário da SPOTNIKS também mostra que outras autoridades de outros países relutaram em tomar medidas urgentes de isolamento social, minimizando os danos do novo vírus, desde personalidades conhecidas em democracias liberais, como o autocrata Trump (que disse que a epidemia não chegaria aos Estados Unidos) até ditadores explícitos que proibiram que a população pronunciasse a palavra coronavirus (como se a negação resolvesse o problema).
No entanto, apesar do horror à ditadura chinesa, o vídeo não menciona que a ditadura chinesa é a mesma ditadura que tem acordos bilionários com os capitalistas brasileiros, como a Vale, os importadores e exportadores do agronegócio e tantos outros, os quais foram em comitiva comercial com Bolsonaro visitar a China.
Aliás, senti falta em todo o documentário da SPOTNIKS de qualquer menção a Bolsonaro na crise do coronavírus, que às alturas do encerramento do vídeo já havia tomado iniciativas parecidas com Trump e dito disparates semelhantes ou piores aos ditadores citados. Bolsonaro já é conhecido internacionalmente como um dos líderes que estão boicotando as orientações científicas e vinha se contrapondo ao seu ministro da saúde nas suas tentativas de controlar a epidemia com isolamento social, até demiti-lo e colocar em seu lugar um zumbi, o que pode nos levar a uma catástrofe ainda maior.
Neste momento, já não tenho mais confiança nos novos números que serão divulgados pelo Ministério da Saúde, pois sem testes suficientes e sem disposição de transparência (leia-se “alinhamento total com o presidente”). Não me espantarei se começarmos a ver diminuição surpreendente da epidemia a partir da posse do novo ministro, contrariando o aumento do trabalho dos coveiros em todo o país.
Se a ditadura chinesa censurou médicos e cientistas, não podemos esquecer que Bolsonaro censurou o INPE sobre os desmatamentos na Amazônia, tentou censurar dados do Instituto Manguinhos sobre a criminalidade e a mudança de ministro da saúde é uma espécie de censura à postura do ex-ministro em defesa do que ele chama de ciência.
Ninguém ignora as besteiras de Bolsonaro sobre hidroxicloroquina e outras posturas anticientíficas, irresponsáveis e desatinadas, mas até quando as elites políticas e econômicas brasileiras pretendem proteger Bolsonaro como um mal necessário para se evitar o lulopetismo? Ou para fazer as reformas econômicas que retiram direitos dos trabalhadores, transformando-os de proletariado em precariado (https://chomsky.info/20120508/ ?
Vale a pena ver os vídeos.
Pode ser que você tenha uma percepção diferente da minha. São dois vídeos que fazem uma crítica liberal à ditadura chinesa antes (o português) e durante a pandemia (da SPOTNIKS). Aprendemos com os dois documentários que em nome de um projeto de hegemonia política e militar a ditadura chinesa cometeu um grave crime contra a humanidade ao censurar as informações sobre o novo coronavírus.
A humanidade somos nós, inclusive os chineses.
Obrigado à Luíza e ao Ernesto pelos vídeos e comentários sobre este texto.
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