Pela descriminalização de todas as drogas

 


Como nos alerta a própria capa deste do livro “Um preço muito alto” de Carl Hart, “não é sempre que lemos um livro que detona tudo que foi falado sobre drogas!” E olha que tive acesso à farmacologia de muitas delas e me julgava liberal e bem informado!

Carl Hart nos fala sobre sua vida, um jovem que tinha grandes probabilidades de ser mais um homem negro capturado nas armadilhas do racismo e se tornou um neurocientista especializado em drogas numa das principais universidades norte-americanas. Ele mostra o papel dos acasos que o conduziram por trilhas diferentes de seus parentes e amigos.

Este livro reorganizou minha visão sobre as drogas e definiu uma plataforma política para as drogas coerente com a ciência. Consistente com documentos científicos, Carl Hart recompõe as fronteiras da ciência (esgarçadas pelos tempos de opiniões e fake news) e apresenta justificativas racionais (políticas, econômicas, sociais, farmacológicas) para a descriminalização de todas as drogas (para quem não sabe a diferença entre descriminalização e legalização, vale ainda mais a pena ler o livro).

Diante disso, faço deste livro mais uma proposta de política pública sobre as drogas para o Programa de Governo do Presidente Lula a partir de janeiro de 2023. Minha outra proposta para Lula é a ideia genial de George Monbiot, de trocarmos a dívida externa dos países pobres pela dívida de carbono dos países ricos, transformando o recurso em desenvolvimento dos países pobres.

Dois comentários ainda sobre Carl Hart: o primeiro é que lamento ter concluído meu doutorado em 1992 (no qual trabalhei com efeitos da cafeína sobre a fadiga em seres humanos) antes dele (1996) começar a mostrar as semelhanças entre os efeitos do crack e da cocaína e outras descobertas incríveis. Eu teria, em retrospecto, sido muito mais crítico sobre os resultados de pesquisas feitas com animais que são aplicados descuidadamente aos seres humanos.

Em segundo, apesar de nos mostrar inúmeras vezes como o acaso determinou sua própria trajetória, Carl Hart ainda acredita que podemos fazer escolhas de vida mais do que eu (e o Sapolsky) consigo perceber. Penso que quanto mais admitimos nossa capacidade de fazer escolhas significativas na vida, mais nos aproximamos do falso terreno ideológico da meritocracia.

De qualquer forma, precisamos acreditar que podemos definir o futuro e, nesse sentido, é reconfortante saber que existe gente como Carl Hart no mundo, que se torna um lugar mais habitável com ele por perto.


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