Mitologia


O populismo precisa de nomes, a democracia de ideias.

Ele é narcisista, vaidoso, ela é discreta, anônima.

Ele pode ser de direita ou de esquerda, ela vê o mundo com ambos os olhos.



O populismo é feito de bandeiras, hinos e heróis, a democracia de música para dançar.

Ele tem horror ao estrangeiro, ela não tem fronteiras.

Um se alimenta das diferenças, a outra digere o ódio.



O populista quer ser macho alfa e forte, a democracia é feminina e alfabetizada.

Ele faz o que manda o facebook, ela se orienta pelo bem comum.

Um manda matar bandidos, a outra quer desproduzir o crime.



O populismo promete metralhar corruptos, a democracia vacina contra a corrupção.

Ele se vangloria da própria meritocracia, ela sabe que o sol não nasce igual para todos.

O populista precisa de armas letais, a democracia de pessoas vivas.



Ele tem certezas absolutas, ela aprende com as dúvidas e o desconhecido.

Um tem pressa, a outra tem todo o tempo do mundo.

O populismo cultua incerto passado, a democracia sonha pontes para o futuro.



Ele disfarça seus latifúndios com o sotaque do povo, ela reparte terras com a poesia.

Ele promete o céu aos seguidores, ela lavoura o terrestre cotidiano das gentes.

O populismo forma milícias ferozes, a democracia festeja os blocos de rua e a alegria.



O populista conhece apenas um tipo de sexo, a democracia muitas maneiras de amar.

Ele se escandaliza com a intimidade alheia, ela acolhe suores e odores.

Um tem medo de sentir medo, a outra acende a razão em nosso quarto escuro.



O populismo nega ciência e evidência, a democracia admite evoluções e mudanças.

Ele usa a palavra macaco como ofensa, ela admira nossa infância primata.

Um acredita na superioridade da sua raça, a outra descarta este lixo da história.



Nas crises, o populismo procura culpados, a democracia encontra especialistas.

Ele adota a religião mais poderosa como verdadeira, ela é ateia ecumênica.

Um destrói a floresta para construir palácios, a outra protege as crianças indígenas.



O populista anda de bermudas e dorme de farda, ela dispensa uniformes e salto alto.

Ele fala somente o que o mais ignorante entende, ela trabalha numa escola para todos.

Para ele a democracia é apenas uma urna, para ela todos os dias são importantes.



Aí, o populista entra na casa da democracia, que o recebe como a qualquer pessoa.

Ele avança pela sala, bisbilhota os quartos, mexe na geladeira e declara que a ama.

Quando a democracia diz não, o populista tenta estupra-la.



A democracia precisa aprender a se defender do populismo.





Comentários

  1. Lor, algumas pessoas agem como se o fim do mundo fosse iminente e que somente aqueles que tiverem riquezas e poder serão poupados. Somos assim.

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  2. Caro Lor, obrigado por sua visita hoje na EEFFTO. E seu texto, como tudo o que vc faz, é brilhante e necessário. Abraços fraternos
    Gustavo côrtes

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