Quem entende o SUS?
Compreendo pouco como funciona o Sistema Único de Saúde, apesar de trabalhar no Centro de Referência em Neurofibromatoses do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais, onde atendemos pelo SUS.
É uma estrutura muito complexa, da qual apenas sei que foi construída democraticamente, que procura dar atendimento público a todas as pessoas com cidadania brasileira e que é considerado um dos melhores sistemas de saúde pública do mundo.
Por isso, fico inseguro quando um governo vem e diz que vai mudar isso ou aquilo no SUS e a oposição discorda, diz que é um erro, que vai prejudicar a população. Como saber quem está com a razão?
Então, o sensato, me parece, é ouvir a opinião das pessoas que estudam e compreendem melhor o SUS.
E o que elas dizem?
Várias entidades relacionadas com a Saúde Pública escreveram um texto sobre o SUS, que adaptei, a seguir, da forma como o entendi.
As entidades criticam algumas medidas do governo atual, como Portaria número 2979/19 do Ministério da Saúde, que ameaça a Saúde da Família e os recursos do SUS.
Para o SUS funcionar bem, ele precisa da participação das diversas instâncias do controle social, além daquelas previstas legalmente, como as conferências e conselhos de saúde.
Um dos órgãos fundamentais para o funcionamento do SUS é o Conselho Nacional de Saúde (CNS), que vinha sendo o principal local de discussão das políticas de saúde.
No entanto, o novo governo está forçando um modelo de financiamento da atenção primária à saúde sem nenhuma conversa com o Conselho Nacional de Saúde, nem com a comunidade científica, e impôs novos critérios de rateio dos recursos destinados aos municípios, que pode alterar profundamente o funcionamento do SUS.
Outra ação danosa deste governo para o povo brasileiro é desmontar os programas de Saúde da Família, que tem sido o principal meio da atenção primária no Brasil. Bolsonaro acabou com Piso da Atenção Básica, sem qualquer estudo que evidencie claramente seus impactos sobre a condição de saúde da população, sobre a desigualdade de acesso nas regiões metropolitanas e a sustentabilidade econômica dos municípios.
Como consequência, com o tal ajuste fiscal, as prefeituras não têm como colocar dinheiro novo para repor os médicos (as) e enfermeiros (as) perdidos nos últimos anos, cujas consequências sociais podem ser desastrosas.
Além disso, o fim do pagamento destinado às equipes em funcionamento dos Núcleos de Apoio à Saúde da Família repercutirá negativamente sobre a qualidade da assistência à saúde, dificultando o acesso da população ao cuidado integral realizado por nutricionistas, fonoaudiólogos (as), fisioterapeutas, psicólogos (as), entre outros.
Mas há reações a estas medidas.
Uma delas, do deputado federal Alexandre Padilha (PT-SP) e o senador Humberto Costa (PT-PE), que apresentaram Projetos de Decreto Legislativo, que pretendem sustar a Portaria nº 2979/19 do Ministério da Saúde.
Eles denunciam que esta portaria tem o objetivo de substituir o modelo de financiamento da atenção primária que vinha funcionando por outro baseado na captação ponderada e no pagamento por desempenho.
Essa mudança foi bolada por técnicos do Ministério da Saúde, sem qualquer transparência, a partir da experiência de países com território, população, renda média e modelo de provimento diferentes do caso brasileiro.
Os parlamentares alertam que esse novo modelo do governo atual não foi elaborado de forma transparente e não garante a redução das desigualdades regionais, ao adotar o número ao adotar o número de pessoas cadastradas como critério para repasse dos recursos, desconsiderando as necessidades de saúde da população, as dimensões epidemiológica, demográfica, socioeconômica, espacial e de capacidade de oferta de ações e de serviços públicos de saúde.
Para piorar, essa proposta está alinhada com a política de austeridade fiscal, que, a partir de 2016, introduziu um teto para as despesas primárias, por meio da Emenda Constitucional 95, que vem reduzindo o piso do governo federal em termos reais per capita.
Essa restrição orçamentária se torna mais grave com as recentes Propostas de Emenda Constitucional apresentadas pelo Ministério da Economia, que visam, a um só tempo, reduzir o teto dos gastos, eliminar o mínimo da saúde na união, estados e municípios e colocar a saúde e a educação numa disputa fratricida – que certamente agravarão as condições epidemiológicas e os vazios assistenciais.
Por causa do perigo desta política do governo Bolsonaro, diversas entidades publicaram um documento contrário a estas condutas e reafirmaram seus compromissos éticos com a democracia e os direitos sociais.
As entidades abaixo pedem aos os parlamentares para aprovarem as propostas de Decreto Legislativo, anulando da Portaria nº 2979/19 do Ministério da Saúde e permitindo a reabertura do diálogo com a comunidade científica, com os movimentos sociais e, especialmente, com os conselhos de saúde – composto por usuários, trabalhadores, prestadores e gestores.
A carta foi assinada em 21 de novembro de 2019, no Rio de Janeiro pelas seguintes entidades:
Associação Brasileira de Enfermagem
Associação Brasileira de Ensino em Fisioterapia
Associação Brasileira de Médicas e Médicos pela Democracia (ver abaixo)
Associação Brasileira de Saúde Coletiva
Associação Brasileira de Saúde Mental
Associação Brasileira dos Terapeutas Ocupacionais
Associação Brasileira de Economia da Saúde
Associação Nacional de Pós-graduandos
Associação Paulista de Saúde Pública
Associação Brasileira de Nutrição
Sindicato dos Trabalhadores da Fiocruz
Centro Brasileiro de Estudos de Saúde
Conselho Federal de Nutricionistas
Conselho Federal de Psicologia
Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguridade Social
Federação Nacional dos Farmacêuticos
Federação Nacional dos Psicólogos
Federação Nacional dos Assistentes Sociais
Federação Nacional dos Sindicatos dos Trabalhadores em Saúde, Trabalho, Previdência e Assistência Social
Federação Nacional dos Enfermeiros
Federação Nacional dos Odontologistas
Associação Brasileira da Rede Unida
Rede Nacional de Médicas e Médicos Populares
Sociedade Brasileira de Bioética
Então, estou mais seguro para dizer: o projeto do governo Bolsonaro não é bom para o SUS e para a Saúde Pública.
Por isso, comecei a participar de um movimento brasileiro de médicas e médicos em defesa da democracia (ABMMD), cuja pauta principal é a preservação e ampliação do Sistema Único de Saúde (SUS) e nesta segunda feira, 25 de novembro, foi criada a diretoria provisória em Minas Gerais (foto).
Se desejar saber mais informações sobre esta associação entre em: https://pt-br.facebook.com/medicospelademocracia/
PS: o desenho acima é uma das propostas em discussão para o logo da ABMMD.
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