Glauber Rocha e o Movimento Diagonalista




Fui ver o documentário do Geneton Moraes sobre o Glauber Rocha, exibido no Festival Internacional de Cinema do Rio de Janeiro, denominado “Cordilheiras ao Mar”. O filme provoca reflexões numa pessoa engajada no Movimento Diagonalista, como eu.

O filme é exemplar na capacidade de expor o intenso dilema vivido pelo cineasta Glauber quando, durante a ditadura, resolveu acreditar que os militares deveriam ser apoiados na sua política nacionalista. 

Geneton mostrou, de um lado, os políticos de esquerda, incluindo o Pasquim, - no filme representado pelo cartunista Jaguar, - condenando a atitude do Glauber. Do outro, alguns amigos tentando defender a liberdade de expressão do cineasta, ainda que incapazes de esconder sua percepção de que Glauber delirava frequentemente.

Os entrevistados, os trechos selecionados das falas e as representações teatrais selecionadas pelo Geneton demonstram uma permanente oscilação do Glauber entre a alucinação política caótica e os impulsos criativos no território da sua arte interrompida pela ditadura e o exílio.

Acabamos desconfiando que a esquizofrenia e os comportamentos neuróticos nos limites da sanidade mental podem ser fonte de energia para a criatividade artística, mas são incompatíveis com a atividade política, que exige racionalidade, capacidade de previsão e articulação social.  Na política, na forma como ela é praticada no sistema capitalista, talvez a única doença mental compatível (e talvez indispensável) ao seu exercício seja a sociopatia, na qual toda capacidade de empatia pelo outro é substituída pelos objetivos individualistas dos predadores narcisistas. Glauber, ao contrário, exibia comportamentos visivelmente paranoicos.

Glauber deixava vazar sua alucinação artística para a política e encontrou resistências ferozes entre os militantes da esquerda reprimida pela ditadura. As críticas e acusações que sofreu aumentaram a fragmentação da sua identidade e agravaram sua solidão e desespero. Numa cena de um dos filmes de Glauber, selecionada pelo Geneton, uma personagem diz: “A política e a poesia são demais para um só homem”. Isso.

Por isso tudo, como membro do Movimento Diagonalista (MD+), adoto a Estética do Vazio. Ninguém jamais me ouvirá dizer que não aguento mais a Dilma e o Eduardo Cunha, empenhados num conflito mortal desesperado para salvar a própria cabeça, ainda que à custa da democracia. Não poderão me acusar de considerar o PSDB do FHC oportunista por apoiar o correntista suíço para derrubar Dilma. Não poderão dizer que detestei a intromissão mandona e sabichona do Lula no governo da Dilma, restaurando o autoritarismo e arrogância dos petistas dos mandatos anteriores, quando aqueles que discordavam dos Zés Dirceus tiveram que sair do PT para fundar o PSOL. Nem mesmo meu luto pelas utopias roubadas me fará dizer qualquer destas coisas. Nunquinha, não misturo política com arte.

Por isso, em homenagem ao Glauber Rocha e coerente com a Estética do Vazio do MD+, apresento o resumo do meu próximo filme, que deverá concorrer no Festival Internacional de Cinema de Jesuânia, no próximo ano.

Título: “Minha casa, quando lá não estou

Duração: 8 horas e 23 minutos
Atores: eu, na porta de saída da casa e eu mesmo na entrada de volta da rua.
Categoria: documentário existencialista
Resumo: Câmeras instaladas em todos os cômodos de minha casa são acionadas e permanecem assim enquanto eu me ausento para trabalhar por cerca de 8 horas. O filme busca demonstrar que os objetos permanecem, de fato, imóveis na ausência de pessoas.
Trilha sonora: TV ligada na Globo News com ruídos de demolição do governo Dilma.
Apoio: Petrobrás e HSBC
Patrocínio: Andrade Gutierrez.


PS: Depois de escrever, vi o filme “A espuma dos dias”, do diretor Michel Gondry (2013). Companheiros Diagonalistas, precisamos realizar novo simpósio para discutirmos este filme: um ícone do nosso pensamento. 



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