Vamos trazer a garotada de volta?



Uma das músicas que mais me emocionam no “The Wall” cantada pelo grupo Pink Floyd é a “Bring the boys back home” (Tragam os rapazes de volta para casa, inspirada numa canção de Freda Charcilia Payne composta contra a guerra do Vietnã – VER AQUI ). A música do Pink Floyd é uma marcha acompanhada por uma banda militar e um coro de centenas de pessoas, num grito pungente pela paz e pela volta ao lar de milhares de jovens soldados que estavam sendo mortos pelos nazistas durante a Segunda Guerra Mundial.

Esta canção tem vindo à minha mente com frequência nos últimos tempos, desde que uma de minhas filhas se mudou com a família para o Canadá, para fugir da recessão econômica, do machismo explosivo e da violência política personificada no assassinato de Marielle Franco (e na mutilação da sua imagem, que continua impunemente desde a quebra da placa com seu nome até esta semana – VER AQUI ).

Somente na minha família, na geração de minhas filhas, entre os treze primos e primas de primeiro grau, seis estão vivendo em países mais democráticos[1], menos violentos (especialmente para as mulheres) e com melhores oportunidades de trabalho pelo respeito aos direitos trabalhistas.

São todas elas de classe média, pessoas que receberam formação universitária, algumas com mestrado, doutorado e pós-doutorado, que não conseguiram trabalhar adequadamente nem serem respeitadas como pessoas no Brasil atual e então juntaram suas crianças e lembranças e foram embora. Seria esta uma nova forma de exílio: o dos “sem-futuro”?

Estas pessoas da minha família são privilegiadas, pois tiveram a oportunidade de estudar e por isso estão sendo acolhidas com bons empregos no exterior, onde desfrutam de salários melhores, boas escolas e atendimento de saúde, ambos serviços públicos de qualidade.

Enquanto isso, aqui continuamos vivendo a tragédia da imensa maioria da nossa população que não tem estas duas chances: adquirir uma capacitação profissional e nem poder sair do Brasil.

Uma tragédia marcada pela tentativa diária de ruptura da democracia por uma onda política autoritária, elitista, racista, machista, que se alimenta da propaganda mentirosa e da violência policial, especialmente contra negros e pobres. Uma onda fascista com inspiração na ideologia nazista, como admitiu o ex-secretário de Cultura do governo Bolsonaro (VER AQUI ).

Lembro os inúmeros casos de pessoas que fugiram da Alemanha à medida que o nazismo ganhava força, antes da tragédia mundial da Segunda Guerra. Como devem ter sido as decisões, as razões objetivas e subjetivas para fugirem do que ainda não sabiam exatamente que viria a acontecer?

Será possível que minha família já esteja vivendo algo semelhante?

Ainda que abalado pela grande tristeza da saudade, não perco a esperança de que podemos resistir aos fascistas e construir um Brasil tão democrático e generoso que minha família haverá de se reunir novamente com todas as outras famílias brasileiras sob o mesmo sol, compartilhando um novo futuro de esperança e felicidade.

LOR



[1] Canadá, Portugal, Alemanha, França e Inglaterra

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